Da Redação – 10h22min
Por Cibele Lemos e Marky Brito
Reflexões sobre o nível da qualidade de vida das pessoas se tornaram centrais nas avaliações do presente e do futuro de estados e nações. Pesquisas e estudos científicos indicam que o termo passou a ser difundido nas rodas de conversas populares desde os anos 1960, ao ser incorporado nas plataformas políticas norte-americanas, pautadas pelo compromisso da administração pública em ampliar o bem-estar social.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a qualidade de vida está ligada à “percepção do indivíduo de sua inserção na vida, no contexto da cultura e sistemas de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações”. Já para o Ministério da Saúde (MS), “envolve o bem-estar espiritual, físico, mental, psicológico e emocional, além de relacionamentos sociais, como família e amigos e, também, saúde, educação, habitação, saneamento básico e outras circunstâncias da vida”.
Dessa forma, podemos afirmar que o tema trata de uma compreensão subjetiva ligada ao sentimento de satisfação e felicidade das pessoas, uma vez que o bem-estar é um sentimento percebido de forma diferente para cada um. Nesse contexto, em novembro o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apresentou pela primeira vez o Índice de Perda de Qualidade de Vida (IPQV) e o Índice de Desempenho Socioeconômico (IDS) dos estados brasileiros.
O lançamento desses novos índices faz parte de uma série de Estatísticas Experimentais do IBGE, em atendimento às recomendações da Organização das Nações Unidas (ONU), cujos valores foram calculados com a utilização de variáveis da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), aplicada entre os anos de 2017 e 2018.
Os indicadores multidimensionais utilizados na mensuração do IPQV visaram à quantificação da qualidade de vida dos brasileiros levando em consideração os seguintes itens: moradia; educação; saúde e alimentação; transporte e lazer; acesso a serviços de utilidade pública; acesso a serviços financeiros e padrão de vida.
O IPQV varia de zero a um, sendo que a menor perda de qualidade de vida se estabelece quanto mais aproximada de zero. Assim, o destaque principal da pesquisa foi a queda na qualidade de vida na área rural do país (0,246), pois esta foi 1,5 vez maior do que a média nacional (0,158), com queda de 1,7 vez maior em relação à área urbana (0,143).
Quanto aos comparativos regionais, a região Norte apresentou a maior perda na qualidade de vida (0,225), juntamente com a região Nordeste (0,209). No período analisado, o estado do Acre (0,238) ocupava a terceira colocação entre os estados brasileiros com maior perda na qualidade de vida, ficando à frente apenas dos estados do Pará (0,244) e Maranhão (0,260).
Sobre os dados apresentados, não há o que se questionar quanto à expertise do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, que desde a década de 1930 apresenta com robustez e clareza estudos qualiquantitativos sobre a população e o território brasileiro. Contudo, para além dos números e análises apresentadas, alguns fatos que permeiam o tema em questão são dignos de ponderação.
Grosso modo, os dados apontados ressaltam ainda mais as diferenças entres os estados que compõem as regiões Norte e Nordeste das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste sem distinguir, a exemplo, que os estados com menor perda na qualidade de vida compõem justamente aqueles que agregam as zonas portuárias e rodoviárias de maior fluxo de mercadorias internas e externas. Esses fatores impactam diretamente em toda a cadeia produtiva, comercial e do consumo de bens e serviços, diretamente ligados aos indicadores multidimensionais destacados pela pesquisa.
Outro fator preponderante é a compreensão de que o IPQV faz parte da série de Estatística Experimental do IBGE constituída de dados do POF sobre os anos de 2017 e 2018. Assim, por seu caráter experimental e totalmente novo, o Índice ainda está sujeito a experimentação, comprovação e avalição comparativa de especialistas da área antes alcançar o status de metodologia consolidada.
Vale ressaltar também, que os indicadores multidimensionais responsáveis pela ponderação dos dados que estabeleceram o IPQV não são de responsabilidade apenas do poder público estadual. Pelo contrário, em grande parte são contemplados pelo conjunto de ações tripartites – União, estados e municípios, sendo, assim, coautores e responsáveis pelo atendimento das demandas que impactam na qualidade de vida da sociedade, levando em consideração as peculiaridades regionais, os contextos históricos e as problemáticas estruturais de cada ente da federação.
A esse respeito, destacam-se os avanços implementados pela atual administração, nitidamente comprovados na última edição (2021) do Ranking de Competitividades dos Estados (RCE), em que o Acre saltou nove posições no pilar temático Segurança Pública, passando a ocupar a 10ª colocação no ranqueamento geral do pilar, ficando à frente de todos os estados da região Norte; Goiás, Espírito Santo, Rio de Janeiro e todos os estados da região Nordeste, menos a Paraíba. Destacam-se ainda o avanço do Acre nos pilares Capital Humano (12ª colocação), Potencial de Mercado (13ª colocação) e Eficiência da Máquina Pública (20ª colocação).
Sendo assim, mesmo diante de um IPQV desafiador, constata-se que as ações governamentais implementadas ao longo dos últimos três anos começam a surtir efeito positivos na melhoria da qualidade de vida dos acreanos e na consolidação da governança comprometida, a longo prazo, com o desenvolvimento do estado do Acre. Assim, apesar de experimentais, tanto o IPQV quanto o IDS são referência para que a atual gestão foque seus esforços em evitar ou sanar as fragilidades encontradas no período avaliado.
Por fim, após a divulgação pelo IBGE, cabe agora às instituições do estado esmiuçar os novos dados e informações fornecidos, para identificar, avaliar e contrapor as políticas públicas que fracassaram e permitiram que a qualidade de vida do povo acreano ficasse em nível tão baixo quando comparada aos valores nacionais e regionais nos anos de 2017 e 2018.
Cibele Lemos, gestora de políticas públicas, mestra em Gestão de Políticas Públicas pela Universidade do Vale do Itajaí (Univali/SC), graduada em Direito (Uninorte/AC) e Geografia (Ufac), atualmente é chefe da Divisão de Estudos e Pesquisas da Seplag/AC.
Marky Brito, engenheiro florestal (UFRA), especialista em Gestão de Projetos (FGV), atualmente é chefe do Departamento de Estudos Pesquisa e Indicadores da Seplag/AC.